Encontro Acadêmico Internacional: Os desafios do setor de transportes para a melhoria da saúde da população
Segue abaixo um breve relato opinativo sobre o evento “Encontro Acadêmico Internacional: Os desafios do setor de transportes para a melhoria da saúde da população”, ocorrido no Anfiteatro João Yunes da Faculdade de Sáude Pública em 03/julho/2013, das 15h às 18h.
O objetivo do evento era debater sobre os desafios do setor de transportes para a melhoria da saúde da população e os possíveis caminhos conjuntos para superar obstáculos atuais de metrópoles em países em desenvolvimento, como São Paulo. Além disso, discutiraspectos relativos à integração da academia com o poder público na elaboração e avaliação de intervenções do setor de transportes e sua repercussão na saúde pública.
A mesa contou com a participação de Profa. Dra. Helena Ribeiro (diretora – Faculdade de Saúde Pública da USP), Profa. Dra. Dirce Maria Trevisan Zanetta (Faculdade de Saúde Pública da USP), Prof. Dr. Carlos Dora (OMS) e o doutorando Thiago Hérick de Sá (Faculdade de Saúde Pública da USP). Houve dois blocos: o primeiro com apresentação de Dora e de Sá, o segundo com debate entre plateia e palestrantes estruturados em dois momentos de perguntas.
1. Exposição de Carlos Dora
Na exposição de Dora foi dada ênfase à questão da avaliação do impacto das políticas públicas (health impact assesment) e à necessária visão sistêmica do impacto. Isso porque a prática comum na pesquisa acadêmica é decidir um recorte específico, abdicar da visão integradora e não investigar com profundidade relações laterais (entre diferentes áreas do conhecimento). Sua apresentação não fora produzida para este evento – ele aproveitara outra que havia acabado de paresentar pela OMS – e contou com muitos dados, como por exemplo os limites do planeta (planetary boundaries) dos quais já ultrapassamos 3 ou que 1/4 da produção de CO2 do planeta provém dos transportes [ver figura 1].
Apresentou também a curva Urban Density versus Transport Related Energy indicando que cidades mais compactas são mais sustentáveis e, portanto, tendem a ser mais saudáveis [ver Figura 2].
De acordo com Dora na formulação de políticas públicas é necessário haver “dados concretos para avaliar qual o impacto dos transportes na saúde pública, só que sabemos pouco sobre isso e comunicamos mal o que sabemos”. Duas abordagens inovadoras ao meu ver foram: (i) pensar sistemas de transportes mais seguros deixando de lado o foco na proteção do indivíduo (capacetes, por exemplo) e focando na proteção coletiva (zonas 30*, por exemplo); e (ii) formular indicadores que tenham foco nas pessoas e não nos carros.
Algo que ele dise que atualmente é ignorado é a questão do emprego e da redução da pobreza relacionada aos transportes, porém, ao vermos a produção científica da área de transportes dos últimos anos percebemos que a comunidade acadêmica vem encarando essa questão como relevantes sim.
Ele aponta os 4 domínios em que os indicadores de transporte saudável deveria medir impacto:
– acesso / equidade de acesso
– atividade física
– poulição (ar, água, sonora)
– acidentes de trânsito
Ele também disse que se focaria no ônibus (classificado por ele como patinho feio dos transportes) mas não tocou muito nessa questão durante a palestra, apenas de forma genérica defendendo o transporte coletivo frente ao individual, sem mais aprofundamentos.
Referências interessantes que ficaram da palestra dele:
– WHO’s Health in Green Economy Series (2011): http://www.who.int/hia/green_economy/en/
– Transit and Health: Mode of Transport, Employer-Sponsored Public Transit Pass Programs, and Physical Activity: http://www.palgrave-journals.com/jphp/journal/v30/nS1/abs/jphp200852a.html
– Physical Activity Associated with Public Transport Use—A Review and Modelling of Potential Benefits: http://www.mdpi.com/1660-4601/9/7/2454
– Appleyard, 1981: http://infosthetics.com/archives/2010/11/research_mapping_the_impact_of_traffic_on_the_livability_of_streets.html#extended
– a própria apresentação do Dora: http://www.iea.org/media/workshops/2013/healthwellbeing/HealthcobenefitsofHousingEnergyEfficienciesintheBroaderUrbanContext1.pdf
2. Exposição de Thiago Sá
Sá empreende um estudo do deslocamento ativo no Brasil e definiu, a priori, quem foram considerados os agentes “ativos nos deslocamentos” como sendo adultos de 18 a 59 anos que acumulam, por dia, 30 minutos ou mais de viagens a pé ou de bicicleta. Tomando como fonte a pesquisa Origem-Destino 1997 e 2007 foram simulados alguns cenários, desde supor que todas viagens curtas (até 1000m) feitas por modos motorizados de transportes fossem substituídas por caminhadas até a combinação desta substituição com um adensamento urbano. Somente este último cenário apresentou diminuição significativa nos tempos de viagens (motorizado e total). Todos cenários implicavam aumento de tempo de viagem a pé ou de bicicleta, tendo em vista aproveitar a necessidade de deslocamento para que seja praticada atividade física e, também, que haja fruição do espaço público. A solução parece simples, porém, para que isso ocorra, é necessário não apenas promover uma profunda refoma urbana como também tornar a cidade mais caminhável, ou seja, agradável e convidativa à escala humana seja pela expressão do mobiliário urbano, seja pelas velocidades e interseções a que os cidadãos estarão sujeitos.
3. Debate
Algumas perguntas deste bloco, na realidade, não foram perguntas – acabaram por ser manifestações. A manifestação das ruas entrou nas casas e sentou na mesa de jantar, e foi à escola e à universidade também fazer seu papel. As falas deste gênero que mais me chamaram a atenção foram relacionadas à invisibilidade do pedestre (porque antes de motorista, motociclista ou ciclista, somos pedestres) e à falta de comunicação entre universidade e a sociedade que a contém. Isto é, como as políticas públicas ignoram e assim desestimulam o andar a pé e como nós, comunidade acadêmcia, temos poucas e frágeis relações com a sociedade no geral, e com o poder público, em específico.
Uma pergunta interessante foi a respeito de como os EUA conseguiram reduzir suas emissões a padrões inferiores aos rcomendados pelas organizações internacionais [ver figura 4]. Como resposta, um tanto óbvia, esclareceu que tratou-se de investimento em tecnologias menos poluentes, mas que não aconceteram as demais consequências positivas do deslocamento ativo, como aumento do tempo de atividade física diária ou diminuição da obesidade.Muito se falou a respeito da formulação e adoção necessária de políticas, o que me motivou a perguntar ao Dora sobre a viabilidade política de tomar certas medidas antipopulares, já que o Prefeito de Bogotá responsável pela adoção do Transmillenium (BRT inspirado no sistema de Curitiba) entre outras medidas não foi reeleito. Esta pergunta infelizmente não foi respondida, mesmo sendo crucial para tantas outras feitas…
Por fim, senti falta de dados técnicos da área de saúde, da apresentação de uma revisão bibliográfica mais vasta e da exploração de visões mais transversais, como se é possível relacionar transportes nas grandes cidades com distúrbios mentais, já que em recente pesquisa da OMS foi constatada em São Paulo uma das mais altas prevalências de trnstornos mentais.